Cabo Verde: Interview with Alita Gomes Dias

Alita Gomes Dias

Presidente do Conselho de Administração dos Correios de Cabo Verde (Correios de Cabo Verde - CCV)

2016-09-05
Alita Gomes Dias

An interview conducted by Alejandro Dorado Nájera (@DoradoAlex) and Diana Lopes

 

Uma das primeiras coisas que o investidor procura quando tem que decidir se investe ou não num pais é a estabilidade política. Cabo Verde sobressai por ser o único pais africano, junto ao Senegal a não ter sofrido golpe de Estado desde a sua independência. Cabo Verde tem também alternância dos partidos no governo o que mostra foça institucional, e um dos resultados melhores da África em liberdade de imprensa, em corrupção e em qualidade democrática segundo Freedom House, Tansparency Internacional e The Economist Intelligence Unit respetivamente. Além da já comentada estabilidade política, quais são as vantagens que o país tem comparado com outras economias regionais?

 

Cabo Verde é um pais com escassos recursos naturais e com muitos desafios a vencer, o que não deixa espaço para conflitos armados. Ademais temos uma nação coesa e julgo pacífica, que ao longo da sua história não possui registo de conflitos armados, exceptuando a luta pela independência. Acredito serem estas as razões que explicam a estabilidade social do pais. Para além da estabilidade, elegeria a segurança como a segunda grande vantagem.

 

A Senhora é a Presidente do Conselho de Administração de uma das empresas de bandeira em Cabo Verde. Tem, 167 anos de história sendo fundada em 1849. Desde então a empresa tem evoluído para abranger não só os serviços postais mas também serviços financeiros. Poderia nos falar um bocado da história de uma empresa tão importante para o país?

 

Os Correios é das empresas mais antigas de Cabo Verde. Então designada de Correios, Telégrafos e Telefones, com a independência manteve-se a mesma estrutura, passando a uma empresa pública, que ainda é, detida a 100% pelo Estado.
Em1995 deu-se a cisão, da qual resultou a criação de duas empresas: os Correios de Cabo Verde e a Cabo Verde Telecom.
A partir de 1995 e com o desenvolvimento tecnológico, verificado nos anos subsequentes, a actividade da empresa foi-se decrescendo, como aliás aconteceu com os operadores postais a nível global.
Nos últimos 4 anos está-se a procurar reposicionar o negócio de modo a garantir a sustentabilidade económico e financeira da empresa, o que possa pela adaptação a era da economia digital

 

Além dos serviços de correios nacionais e internacionais, uma grande parte do trabalho de Correios de Cabo Verde é feita pelos serviços financeiros, nomeadamente, pagamento de algumas pensões do Estado, a prestação de serviços para a Electra e a Caixa Económica, e serviços de transferência de dinheiro como o Eurogiro, TeleMoneyOrder, transferência electrónica nacional e colaborações com Money Gram, MoneyExpress, MoneyExchange. Como está repartido o seu negócio e os benefícios da empresa entre essas diferentes atividades?

 

Os Correios têm actualmente 3 áreas de negócio.
A logística postal, que tende a decrescer, com a excepção das encomendas, que está sendo impulsionado pelo fenómeno do e-commerce;
Os serviços financeiros, que incluem transferências de dinheiro e pagamento de pensões, sendo de destacar a componente das transferência de remessas, na sua maioria de emigrantes e cujo volume de negocio em 2015 foi 3 milhões de contos

 

Os Correios têm um historial de prestação de serviços financeiros que vem de longa data. Já época colonial tinha a Caixa Económica Postal que depois deu origem à Caixa Económica de Cabo Verde Mais recentemente, , houve várias tentativas de criação de um banco postal que entretanto não se concretizaram porque o Estado decidiu criar o Novo Banco no qual os Correios detém uma participação.
Por último, mas igualmente importante, os serviços de conveniência e proximidade, designadamente cobrança de facturas de utilities e impostos.

 

Então, CCV é um grupo que conta com participações em outras empresas como Caixa Económica de Cabo Verde, Novo Banco, como a Senhora falou, mas também no Cabo Verde Telecom, na Garantia Seguros ou na Sociedade Cabo-verdiana de Tabaco. Poderia nos falar mais dessa estrutura empresarial e de participações e sobre a relação com essas empresas?

 

O investimento nessas participadas constitui atualmente umas das principais fontes de receitas da empresa e até 2008 os dividendos suprimiam o défice operacional.
Mesmo assim, embora tenha-se registado, alguma redução da rentabilidade dessas empresas, os dividendos continuam a ter peso importante nas receitas globais da empresa. A participação mais relevante é a da Caixa Económica de Cavo Verde (15,14%), seguida do Novo Banco, Garantia, CV Telecom e Sociedade de Tabacos.

 

Falamos das vantagens de Cabo Verde como economia, mas uma das desvantagens é o fato de ser um mercado atomizado em 10 ilhas. Um dos desafios do novo Governo é aumentar, não só a integração da economia cabo-verdiana na economia global, mas aumentar a própria coesão interna. Como os Correios fazem para que essa divisão do mercado não seja um problema? Qual é a presença de Correios no território nacional, a estrutura dos Correios em termos de estrutura e de pessoal?

 

Actualmente os Correios tem uma equipa de 200 colaboradores e 31 Agencias, o que garante presença em todos os Concelhos. A empresa tem sede na Praia e cada agencia tem um responsável que reporta para a sede.

 

Sua Excelência o Primeiro Ministro Correia e Silva nomeou as tecnologias de informação e comunicação como uma das principais potencialidades da economia cabo-verdiana. A Senhora foi nomeada em 2008 com a meta de fazer com que CCV liderasse o sector das novas TICs dado a sua trajetória profissional. Correios têm avançado muito neste sentido, um exemplo disso é o serviço “Morada Certa”. Poderia nos falar mais da implantação das TICs nos CCV e os planos de futuro neste sentido?

 

O desafio actual é reposicionar o negocio da empresa tirando partido dos principais activos que a mesma dispõe: o know-haw da logística postal e a cobertura nacional da rede de balcões. Para tal a empresa tem em curso um processo de restruturação do modelo de negócio bem como dos processos operacionais, onde a adopção e utilização das TIC’s é incontornável.

 

Os Correios pretendem se posicionar para virem a ser num futuro próximo um operador logístico de referencia a nível nacional e líder no last mile. É sem duvida um grande desafio, tendo em conta os constrangimentos existentes ao nível dos transportes, designadamente nas ligações domestica, mas é igualmente uma oportunidade , tendo em conta que, quase tudo, encontra-se por fazer.

 

CCV é o fruto de uma excisão da antiga CTT para poder realizar a privatização do atual Cabo Verde Telecom. Atualmente a empresa é 100% pública. Tem o governo planos de privatização da empresa ou de participação do sector privado?

 

A implementação do plano de restruturação exige recursos e neste momento a empresa não tem meios para autofinanciamento, pelo que o accionista, que é o Estado, terá que se posicionar. Não tivemos ainda a oportunidade de analisar este assunto com o novo governo, mas julgo que oportunamente teremos uma decisão.

 

Além da participação na coesão nacional, CCV tem tido um papel muito importante na divulgação da imagem de Cabo Verde além fronteiras. CCV participa de forma ativa na promoção do país através da divulgação da sua imagem e a sua cultura a través dos selos. Porque é tão importante para vocês essa divulgação da imagem do pais lá fora?

 

O selo constitui actualmente o maior produto turístico dos Correios. Anualmente, são dados á estampa uma media de 5 a 6 novas emissões, com os mais variados temas – música, monumentos e sítios históricos, hábitos e costumes, fauna, flora entre outros motivos - e vendidos aproximadamente entre 130 a 150 mil selos, que se destinam essencialmente á franquia de postais turísticos.

 

Para finalizar, qual é a mensagem que a Senhora queria transmitir aos potenciais investidores e leitores da HBR em relação aos CCV e a Cabo Verde?

 

Como pais pequeno que somos, considero ser um contexto interessante para fazer experiencias, funcionando como “laboratório” para a realização de testes de novos modelos de negócios e de novas tecnologias, no que poderíamos designar de um ambiente controlado. Mas para isso, precisamos nos sofisticar em alguns aspectos, designadamente em termos de qualidade, de eficiência e eficácia na gestão dos poucos recursos que temos. Naturalmente, precisamos e seria desejável atrair mais conhecimento e know-how, através de intercâmbios com quadros de outros países e nacionalidades, por forma a termos diferentes visões no projecto comum e desafiante que é transformar Cabo Verde num pais desenvolvido.